Por mais que sua trama se relacione com a questão da repressão
política no Brasil dos anos 70, seria inexato dizer que “Cara ou coroa” (2012) seria
essencialmente um “filme sobre a ditadura”. O filme de Ugo Giorgetti é bem mais
do que isso: versa sobre a memória e o imaginário cultural do próprio diretor.
Assim, não é à toa que o filme se comunique de forma tão fluente com outras
expressões culturais também caras ao cineasta. O roteiro desenvolve boa parte
de suas situações no meio teatral, indo do fato de que um de seus personagens
principais personagens é um diretor de peças até pequenos e expressivos trechos
ligados ao meio (no melhor deles, uma crítica teatral, recém saída de uma breve
temporada na cadeia por questões políticas, faz ácidas assertivas sobre o
futuro do país). Já a literatura tem uma presença discreta, mas marcante, em “Cara
ou coroa” – a narração em primeira pessoa e algumas nuances dos diálogos
remetem a uma forte conotação literária pelo
alto nível articulado de suas palavras, mas sem cair em empostações. Dentro
dessa narrativa que apresenta tantos detalhes e referências, Giorgetti exerce
um cinema marcado pela contenção e sobriedade. Por mais que os personagens
passem por situações limites, o diretor exerce a tensão com precisão, sem
descambar para o óbvio ou o facilmente emocional. Essa abordagem se estende
para uma estética elegante, principalmente pela direção de fotografia que
valoriza os jogos de claro e escuro de alguma tomadas essenciais para o filme.
O apuro formal de “Cara ou coroa” se relaciona de maneira
sofisticada com o seu complexo conteúdo temático, fazendo com que a produção de
Giorgetti esteja muito além das categorizações óbvias e seja uma pérola recente
da filmografia nacional a ser descoberta.
Um comentário:
É um filme sobre os temores que as pessoas sentiam naquele tempo. Tive a sorte de assistir a esse filme com a presença ilustre do diretor aqui na capital quando o filme estreou. Recomendo.
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