Antes de mais nada, cabe dizer que a pretensão do diretor Marcelo
Machado em “Tropicália” (2012) não é fazer um retrato objetivo e definitivo
sobre o movimento musical em questão. O viés do documentário é mais subjetivo e
pessoal, no sentido de captar as impressões de alguns dos principais artífices
daquilo que se convencionou chamar de Tropicália. Dentro dessa concepção,
pode-se perceber tons diferentes que variam durante a narrativa de acordo com o
depoente. Quando Tom Zé tem a palavra, há algo de messiânico e delirante no ar –
tanto que o músico em alguns momentos quebra a própria estética sóbria adotada
por Machado ao sair do enquadramento delimitado formalmente para expor suas
teorias históricas e apocalípticas. Já com Gilberto Gil a atmosfera burilada
evoca serenidade. E quando as lentes se voltam para Caetano Veloso, esse adota
uma postura que beira o melancólico, o que provoca até uma contradição
perturbadora com os próprios preceitos artísticos da Tropicália, um estilo
marcado pela ironia, escracho e uma certa alegria. Veloso enfatiza as perdas
que teve com a consequente perseguição política que sofreu com a ditadura
militar pela sua participação no movimento, e questionando o que poderia ter
sido da sua vida senão tivesse sido preso e exilado. Geralmente o cantor é
acusado de ser uma espécie de ator de si mesmo. E se na produção em questão ele
está realmente atuando, há de se convir que Caetano Veloso é um intérprete dramático
bem convincente...
As diferenças de espírito que se estabelecem entre os protagonistas
de “Tropicália” acabam oferecendo uma dimensão humana e cultural ainda mais
complexa para a temática abordada por Machado, o que aliado a preciosos
registros visuais históricos e à bela trilha sonora (com as inevitáveis canções
mais emblemáticas do movimento) compõe um documentário envolvente, não só pelo
seu aspecto histórico, mas também pelo prazer sensorial de suas imagens e sons.
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