terça-feira, janeiro 06, 2015

Êxodo: Deuses e reis, de Ridley Scott **1/2


No estranho misto de ficção científica e conto gótico de horror de “Prometheus” (2012) e no policial de ambiências rarefeitas “O conselheiro do crime” (2013), o diretor Ridley Scott buscou caminhos inesperados para o seu cinema, desviando com habilidade de boa parte dos clichês narrativos que por vezes vinham impregnando seus filmes anteriores. Tal ousadia rendeu alguns narizes torcidos por parte de público e crítica. Assim, “Êxodo: Deuses e reis” (2014) é a volta de Scott a concepções formais mais digeríveis, assim como marca o seu retorno a um gênero no qual já havia enveredado, o dos filmes de época épicos (vide “Gladiador” e “Cruzadas”). Talvez a novidade seja que o cineasta agora busque inspiração em episódios bíblicos. Nesse sentido, dá para dizer que há um diferencial nessa nova versão cinematográfica da vida de Moisés em relação ao clássico “Os dez mandamentos” (1956) de Cecil B. DeMille: Scott realmente procurou adaptar a história para um tipo de abordagem mais contemporânea. Assim, o Moisés (Christian Bale) dessa nova adaptação é quase um super-herói guerreiro, uma espécie de misto do Maximus de “Gladiador” (2000) e Batman. Há uma grande ênfase no detalhismo gráfico das cenas de batalha, caracterizações dramáticas caricaturizadas, temas musicais ostensivos beirando o barulhento. Ou seja, a sutileza passa longe daqui... As escolhas estéticas de Scott por vezes são eficientes e divertem como entretenimento, mas no geral dão origem a uma obra genérica e pouco memorável. Esse tratamento artístico acaba deixando de lado alguns aspectos interessantes e até intrigantes de “Êxodo”. O maior deles é a forma como Deus é retratado na trama, na figura de uma criança com rompantes vingativos e cruéis, cujos desígnios beiram o capricho, o que provoca dúvidas existenciais que atormentam Moisés. Scott poderia ter explorado mais esse lado contraditório da natureza das intenções divinas e os consequentes questionamentos de seu protagonista (guardada às devidas proporções, tal dilema faz lembrar o cerne da obra-prima “A última tentação de Cristo” de Martin Scorsese). O diretor preferiu, entretanto, reduzir tal dubiedade e se concentrar no simples espetáculo moralista. Aliás, não é curioso que em 2014, ano marcado pelo maior endurecimento da política de ocupação e repressão dos judeus em relação aos palestinos, tenham sido lançados “Noé” e “Êxodo”, obras que enfatizam o papel dos judeus como escolhidos de Deus?

Um comentário:

Marcelo Castro Moraes disse...

Assisti a esse filme e devo confessar que devo assistir de novo, pois não consegui capitar para qual caminho o diretor realmente quis ir