Um filme com mais de quatros horas de duração já faz o
espectador desavisado pensar em algum épico histórico ou algo semelhante. De
certa forma, até dá para dizer que Jacques Rivette fez uma espécie de épico em “Amor
louco” (1969), mas direcionado a um relacionamento amoroso. No filme em questão,
a trama se foca em dois planos – nos ensaios de uma peça e na decadência do
relacionamento amoroso do diretor da referida montagem com sua esposa, atriz
afastada da montagem mencionada. A ligação entre teatro e cinema é recorrente
na filmografia de Rivette e aqui atinge um ponto extraordinário em sua fluência
narrativa. As tomadas das passagens de texto, das discussões, dos laboratórios,
trazem ângulos e enquadramentos que oferecem uma dimensão inusitada para as
duas mídias. No cerne da produção fica evidente que o interesse maior de
Rivette está no registro do processo criativo de uma montagem teatral e não
tanto no resultado final (o que faz lembrar o recente e extraordinário “César
deve morrer”). A evolução artística da montagem, entretanto, parece
corresponder à degradação da vida pessoal de seu principal artífice. Nesse
sentido, a longa duração de “Amor louco” se justifica para além da mera
excentricidade. Rivette esmiúça os passos da dissolução mental da protagonista
Claire (Bulle Ogier) em cenas de uma crueza emocional exasperante. Nada parece
acontecer de forma gratuita, sendo que a decadência do relacionamento dos
amantes se estende e consolida de forma indelével. Seu melancólico ocaso, não à
toa, coincide com o ápice criativo da encenação que é a outra tônica da produção,
numa conclusão de perversa ironia de Rivette.
2 comentários:
Queria ter assistido, mesmo exigido de mim muita paciência.
Esta sendo exibida na 47a. Mostra de Cinema. Versão restaurada!
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