segunda-feira, setembro 02, 2013

Tabu, de Miguel Gomes ****


Num primeiro momento, a estética peculiar da produção portuguesa “Tabu” (2012) pode sugerir um certo hermetismo. Afinal, o diretor Miguel Gomes estabelece inextricável formalismo envolvendo citações e referências cinematográficas e abordagem literária, principalmente no segundo momento da trama. O que ocorre, entretanto, é que o filme impressiona justamente pela fluência da narrativa em meio a suas experiências estéticas. Gomes perverte as noções de dramaticidade e de tempo. Na primeira história que se desenvolve, predomina a atmosfera de melancolia no meio de temas de viés triste como a solidão e a velhice. No subtexto, pairam questões como o preconceito e a tradição colonialista de Portugal. Gomes foge do óbvio, inserindo sutis traços irônicos, mesmo quando a morte e a decrepitude vão se tornando mais evidentes. Quando a trama passa para a segunda parte, a visão artística do cineasta se torna ainda mais particular. É como se tratassem de lembranças do narrador. Sua voz parece impertubável com as memórias que evoca, dando a impressão de quase recitar suas falas. Essa prosa poética produz um contraste admirável e perturbador com as imagens de tons nostálgicos que emanam da tela. Como se tratam de lembranças, fotografia e direção de arte não se vinculam a uma predisposição ao realismo. Ao contrário – a estilização fala mais alto, com direito a números musicais que dão a impressão da reconstituição distorcida das antigas produções de Hollywood. Raras vezes as paisagens africanas pareceram tão sedutoras e até mesmo oníricas, mas o senso de sarcasmo perverso de Gomes nunca deixar cair “Tabu” no simples contemplar de uma beleza visual superficial. A trágica história de amor proibido que é o centro do roteiro, no final das contas, é mais um sintoma de alienação dos colonizadores perante a realidade de exploração econômica e social entre os europeus e os nativos do continente.

Um comentário:

Marcelo Castro Moraes disse...

Um dos melhores filmes do ano e uma bela homenagem ao cineasta de Nosferatu.