Num primeiro momento, a estética peculiar da produção
portuguesa “Tabu” (2012) pode sugerir um certo hermetismo. Afinal, o diretor
Miguel Gomes estabelece inextricável formalismo envolvendo citações e referências
cinematográficas e abordagem literária, principalmente no segundo momento da
trama. O que ocorre, entretanto, é que o filme impressiona justamente pela fluência
da narrativa em meio a suas experiências estéticas. Gomes perverte as noções de
dramaticidade e de tempo. Na primeira história que se desenvolve, predomina a
atmosfera de melancolia no meio de temas de viés triste como a solidão e a
velhice. No subtexto, pairam questões como o preconceito e a tradição
colonialista de Portugal. Gomes foge do óbvio, inserindo sutis traços irônicos,
mesmo quando a morte e a decrepitude vão se tornando mais evidentes. Quando a
trama passa para a segunda parte, a visão artística do cineasta se torna ainda
mais particular. É como se tratassem de lembranças do narrador. Sua voz parece
impertubável com as memórias que evoca, dando a impressão de quase recitar suas
falas. Essa prosa poética produz um contraste admirável e perturbador com as
imagens de tons nostálgicos que emanam da tela. Como se tratam de lembranças,
fotografia e direção de arte não se vinculam a uma predisposição ao realismo.
Ao contrário – a estilização fala mais alto, com direito a números musicais que
dão a impressão da reconstituição distorcida das antigas produções de Hollywood.
Raras vezes as paisagens africanas pareceram tão sedutoras e até mesmo oníricas,
mas o senso de sarcasmo perverso de Gomes nunca deixar cair “Tabu” no simples
contemplar de uma beleza visual superficial. A trágica história de amor
proibido que é o centro do roteiro, no final das contas, é mais um sintoma de
alienação dos colonizadores perante a realidade de exploração econômica e
social entre os europeus e os nativos do continente.
Um comentário:
Um dos melhores filmes do ano e uma bela homenagem ao cineasta de Nosferatu.
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