terça-feira, janeiro 21, 2014

A grande beleza, de Paolo Sorrentino ***1/2


É difícil falar sobre “A grande beleza” (2013) sem pensar em “A doce vida” (1960). Isso porque o filme mais recente do diretor italiano Paolo Sorrentino parece uma releitura contemporânea do grande clássico de Federico Fellini, ainda mais se pensarmos que ambos se passam em Roma. A verdade, entretanto, é que tal definição pode ser imprecisa, pois “A doce vida” é daqueles raros tipos de produção que já nasceram atemporais: não importa a época em que tal filme seja visto, ele sempre terá um alcance universal e em sintonia com qualquer época. Isso não torna o trabalho de Sorrentino dispensável, mas de certa forma o prejudica na comparação. A trama já é bem característica para essa relação – um escritor em crise criativa e afundado em hedonismos diversos vaga pela capital romana encontrando tipos variados e situações inusitadas, fazendo com que fique tomado por uma sensação constante de vazio existencial. Mas essa revisão do ideário de uma obra-prima consagrada não se efetiva por meios exatamente óbvios. Por mais que “A doce vida” trouxesse momentos com uma certa queda para o absurdo, a encenação proposta por Fellini era marcada pela sobriedade, sem a preponderância para a abordagem sentimental da primeira fase da sua carreira e sem se aprofundar no senso delirante de filmar de seus trabalhos posteriores. Pois “A grande beleza”, a grosso modo, faz a gente pensar num “A doce vida” refilmado segundo a ótica do grotesco e do exagero que Fellini usou e abusou em obras como “Satyricon” (1969) e “Amarcord” (1973). Sorrentino impressiona em algumas seqüências pelo senso barroco e virtuose com que filma, principalmente nas seqüências de festas, em que seu estilo exagerado na caracterização de personagens e opulência visual provoca um efeito perturbador e contraditório de atração e repulsa. Quando o cineasta pisa no freio nas partes mais intimistas do filme, pode-se perceber que a falta de sutileza impede que tais momentos tenham uma maior densidade dramática, ainda que por vezes o senso de ironia do cineasta revele uma veia sarcástica acima da média. É justamente nesse ponto que a comparação entre as duas obras em questão mais se expõe, com claros pontos a favor de Fellini: aquele tom de crítica amarga que era natural e de simbologia fascinante em “A doce vida” acaba soando um tanto forçado e ingênuo em “A grande beleza”. Mesmo assim, a obra de Sorrentino se mostra como um trabalho de relevo considerável dentro da cinematografia atual, reforçando o nome do diretor como um dos mais expressivos de sua geração no cinema italiano.

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