quarta-feira, junho 03, 2015

Nick Cave - 20.000 dias na Terra, de Iain Forshty e Janne Pollard ****


Há um momento bastante revelador em “Nick Cave – 20.000 dias na Terra” (2014) tanto sobre o seu protagonista quanto sobre a própria natureza do filme em questão: quando a cantora Kyle Minogue coloca que leu uma biografia sobre Cave para conhecer mais sobre ele, o cantor afirma que aquele livro está muito longe da sua verdade. Para essa produção, o essencial não está em decifrar todas as “verdades” relativas ao seu protagonista. Não há a preocupação em fazer uma tradicional, literal e cronológica exposição de fatos sobre a vida de Cave. O que interessa efetivamente é criar uma atmosfera existencial e artística semelhante às canções e escritos do artista. Nesse sentido, a obra dos diretores Iain Forsyth e Jane Pollard é muito bem sucedida, afastando-se na maioria das vezes dos clichês característicos dos documentários biográficos. Na verdade, nem daria para classificar o filme como um documentário propriamente dito. Isso porque a linha narrativa apenas se apropria de alguns elementos factuais para encená-los de acordo com a criatividade dos cineastas e do próprio Cave. Não é a espontaneidade ou o realismo que estão em pauta, mas sim os meios mais líricos que possam expressar as obsessões estéticas e a particular visão de mundo do músico e compositor. Essa forma de expressão vai se manifestando de várias formas: flashes do cotidiano, entrevistas encenadas como se fossem conversas casuais ou mesmo delirantes, intensos números musicais (as versões das canções que constam no filme superam de longe aquelas originais nos álbuns correspondentes), digressões em cima de fotos e lembranças. Dentro desse poético mosaico de informações e impressões, prevalece e se preserva intacta a mágica da arte de Nick Cave em toda a sua sutileza e mistério. A extraordinária seqüência final, com a câmera se afastando no mar e a imagem do artista solitário na praia cada vez ficando menor é a síntese perfeita e contundente de tudo o que vimos: sabemos um pouco mais sobre Cave, mas ele permanece como um fascinante enigma artístico. E para sempre assim ele deve permanecer....

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