terça-feira, fevereiro 02, 2010

Lula - O Filho do Brasil, de Fábio Barreto *1/2


A relação de Lula com o cinema brasileiro não é recente. O atual presidente da república brasileiro já havia tido participações importantes nos documentários “Linha de Montagem” (1982), “O ABC da Greve” (1990), “Peões” (2004) e “Entreatos” (2004), obras que focalizam Luis Inácio em diferentes momentos da sua vida. Em qualquer um deles, pode-se ver alguns fragmentos relevantes da vida e da própria personalidade de Lula, tanto pelos seus valores positivos quanto por interessantes contradições. Dessa forma, tais produções oferecem parte da dimensão humana daquele que é uma das figuras públicas nacionais mais relevantes das últimas décadas.

O principal pecado de “Lula – O Filho do Brasil” (2009) está justamente no fato de não conseguir mostrar nas telas um Lula que pareça verdadeiro, além de não conseguir transformar a vida de um homem com uma biografia tão rica em uma narrativa consistente. O diretor Fábio Barreto preferiu adotar o caminho fácil de transformar os 35 primeiros anos da existência de seu personagem título em um grande e superficial resumo que se desenrola de forma mecânica e pouco fluida. Fatos fundamentais e complexos são simplificados em momentos de puro dramalhão mexicano que chegam às raias do risível, os diálogos não têm um pingo de naturalidade e a caracterização dos personagens é reduzida a estereótipos patéticos (qualquer fala proferida por Glória Pires, por exemplo, é alguma lição de vida edificante).

Trabalhar com lugares comuns e dispensar densidades psicológicas na recriação da História não chega a ser um defeito em termos de cinema. Para ilustrar isso, é só pensar no clássico “A Batalha de Argel” (1966), em que Gillo Pontecorvo oferece uma visão ostensivamente maniqueísta e panfletária para fatos históricos, além de não fazer muitas individualizações dramáticas de seus personagens. O diretor italiano, entretanto, obteve uma dinâmica narrativa espetacular para sua obra, transformando aquela massa de protagonistas, coadjuvantes e até mesmo figurantes em um único e expressivo personagem que se move com precisão de acordo com a vontade rigorosa de Pontecorvo. Barreto, por sua vez, não tem nada que possa lembrar desse tipo de domínio de ritmo cinematográfico. Ele apenas reproduz os eventos ordenados no roteiro com a assepsia e a carência de ousadia típicas das produções televisivas globais mais rasteiras. Além disso, evidencia-se em “Lula – O Filho do Brasil” a desagradável impressão de uma produção feita a toque de caixa. Como explicar, nesse sentido, as variações do registro de voz de Rui Ricardo Dias (o Lula na fase adulta) que começa num tom natural e lá pelo terço final do filme embarca sem cerimônia naquele estilo roufenho típico do presidente brasileiro?

Mesmo com todas essas limitações, entretanto, “Lula – O Filho do Brasil” é uma obra que pode funcionar como um forte material de propaganda em uma campanha eleitoral. Não tanto pelos seus questionáveis méritos artísticos, mas sim pela contundente história pessoal de Lula, capaz de provocar aqueles sentimentos empáticos de compaixão e admiração em boa parte do povo da nação brasileira.

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