Na transposição de uma obra literária para o cinema, é claro
que diretor e roteirista acabarão cometendo algumas licenças poéticas em nome
da formatação adequada de uma linguagem artística para outra. Afinal, há
detalhes que podem funcionar bem no livro e não fazer muito sentido na tela. O
que não pode acontecer é na versão cinematográfica a essência do texto original
se perder. Pois é justamente o que acontece em “Diário de um jornalista bêbado”
(2011): o romance (com toques autobiográficos) de Hunter Thompson é marcado por
uma visão cínica e pouco emocional da desastrada temporada de um jornalista em
San Juan, Porto Rico, na década de 50. Thompson constrói uma narrativa seca de
uma época e lugar marcados por inúmeras picaretagens econômicas e demais
amoralidades, e pontuada por muito sexo e álcool, estabelecendo uma atmosfera sórdida
e irônicas repleta de criaturas decadentes e perigosas. Nas mãos do diretor
Bruce Robinson, esse fascinante panorama acaba se resumindo a uma engraçadinha
(e por vezes até edificante) trama das desventuras exóticas de um protagonista
insosso e boa praça. Em termos formais o filme é competente, mas comportado
demais para uma produção ligada ao universo extremo de Thompson (é só lembrar
da extraordinária versão delirante de Terry Gillian para “Medo e delírio em Las
Vegas”, que, por sinal, também trazia o mesmo Johnny Depp no papel principal).
No cômputo geral, não dá para não cair numa típica frase de impacto: se
Thompson ainda estivesse vivo e visse “Diário de um jornalista bêbado”,
provavelmente sentiria náuseas (e não seria devido à ressaca...).
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