sexta-feira, agosto 03, 2012

Uma longa viagem, de Lucia Murat ***1/2


Se por um lado “Uma longa viagem” (2011) representa uma espécie de acerto de contas emocional da diretora Lucia Murat com o seu passado de presa política durante a ditadura militar, por outro o filme também ganha a dimensão de uma grande experiência estética por parte da cineasta. A princípio, a obra poderia ser um documentário “normal”, daqueles que bastaria depoimentos e imagens de arquivo para configurar o seu arcabouço formal. Murat, entretanto, vai mais longe – além dos elementos tradicionais desse tipo de produção, há também encenações dramáticas de passagens das delirantes correspondências escritas na época pelo irmão da diretora, Heitor. No período em questão, ele vivia no exterior, onde viveu diversas experiências, boa parte delas sob efeito de drogas. A encenação proposta por Murat se esquiva da simples recriação naturalista dos fatos; em sintonia com o próprio conteúdo intrincado da correspondência, tais momentos adquirem uma concepção estilizada que beira o onírico, com o ator Caio Blat declamando seus textos em meio a projeções de imagens de época. O estilo de filmar e editar estabelecido pela diretora, além de ousado, também é coerente com a natureza temática do roteiro, fazendo com que a trajetória de Heitor, marcado por questionamentos complexos e viagens lisérgicas, ganhe uma moldura formal sensível e em sintonia com o seu ideário.

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