Numa primeira impressão, pode-se dizer que “As vantagens de
ser invisível” (2012) faz parte daquele tipo de filme que nos últimos tempos
praticamente se converteu num gênero – aquelas produções indies que pretendem
retratar as relações humanas de forma mais realista, mas tendo por embalagem um
jeitão pop, cheio de referências e citações culturais de um universo um tanto
específico. Colocar essa produção dirigida por Stephen Chbosky dentro dessa
classificação, entretanto, seria um reducionismo. Não que o filme não traga
alguns desses elementos, mas a sua pretensão artística é bem mais ampla e
interessante. E mesmo tais elementos adquirem um sentido especial na narrativa.
Para começar, o roteiro traz um sofisticado jogo de inversão de perspectiva. O
protagonista Charlie (Logan Lerman) é um jovem
introspectivo e de ambições literárias. Enxergamos a trama do filme pelo seu
olhar, e essa visão é a de um pretenso romancista. Nesse contexto, o que se
passa aos nossos olhos é uma espécie de crônica de costumes tanto de uma família
típica classe média quanto de uma juventude. Não é a toa que em determinada
passagem um professor de Charlie lhe recomenda “O grande Gatsby” de F. Scott
Fitzgerald para ler – Fitzgerald era um exímio dissecador dos costumes dos
novos ricos do início do século XX. Esse paralelo com a literatura traz um dos
aspectos mais inquietantes de “As vantagens de ser invisível” – o filme traz
uma ambientação atemporal, em que não se consegue precisar com exatidão a época
em que se desenrola (pode ser tanto nos final dos anos 90 como em parte desse
novo milênio). A brilhante utilização de uma trilha sonora cancioneira realça
essa impressão de algo fora do tempo e do espaço, e reforça que a visão de
Charlie carrega forte conotação conceitual e
por vezes idealizada, em que os comportamentos diferenciados de seus amigos e
colegas parecem refletir uma gama complexa de sentimentos e atitudes. Só que a
condição de observador do protagonista aos
poucos vai se esfacelando, colocando-o em situações limites e também expondo
seus demônios interiores. Essa transformação da postura do personagem principal
dá uma dimensão artística e humana desconcertante para “As vantagens de ser
invisível”, mostrando que o filme tem um alcance universal muito maior que
aquela catalogação “indie” mencionada no início desse texto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário