É claro que os aspectos históricos da trama biográfica de “Hitchcock”
(2012) são saborosos, configurando um forte atrativo para cinéfilos e neófitos.
A grande força do filme de Sacha Gervasi, entretanto, está na sua construção
estética. A trama da obra se desenvolve a partir de um processo tortuoso e
fascinante – o caso real dos múltiplos assassinatos cometidos pelo psicopata Ed
Gein se transformou no livro ficcional chamado “Psicose” que foi adaptado por
Hitchcock no clássico do suspense de 1960 e, por fim, todas essas ramificações
se unem no roteiro da produção de Gervasi. Essa atribulada trajetória não é
recriada por um viés necessariamente naturalista ou exatamente fieis aos fatos.
O que se apresenta na tela é muito mais os aspectos lendários que rondam o
nosso imaginário cinematográfico sobre Hitchcock e “Psicose”, sem que, contudo,
a produção deixe de ser muito esclarecedora sobre os mecanismos de realização e
dos interesses que envolviam (e ainda envolvem) a indústria de cinema em
Hollywood.
No seu formalismo, há uma grande sacada estética por parte
de Gervasi em “Hitchcock” – apesar de biográfico, ele formata o filme como se
fosse uma obra de suspense, na melhor tradição de seu protagonista.
As viradas do roteiro, as ambientações tensas, a trilha sonora quase paródica a
emular temas de Bernard Herrmann, habitual colaborador de Hitchcock – tudo funciona
como uma espécie de caricatura irônica do próprio estilo do cineasta. Essa
viagem pelas concepções artísticas do diretor, por vezes, chega às raias do
perturbador, vide as seqüências oníricas (ou mesmo delirantes) em que Hitchcock
interage com Ed Gein tanto como pesquisa para “Psicose” como para
aconselhamentos pessoais.... É por essa abordagem insólita que “Hitchcock” se
impõe como umas das obras recentes mais contundentes a discutir o fazer
cinematográfico, além de valorizar de forma perspicaz o gênio estilístico de um
dos maiores mestres do cinema.
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