O intimismo do cinema de Philippe Garrel ganha uma conotação
ainda mais inesperada em “Beijos de emergência” (1989). Ao focar a história de
um cineasta (interpretado pelo próprio Garrel) que se vê num dilema conjugal ao
resolver filmar um roteiro de forte conotação
autobiográfica, o diretor propõe uma narrativa que se pauta por um naturalismo
poético. Impressiona muito a fluência que beira o despudorado com que Garrel
estabelece a sua encenação. Não é à toa que os intérpretes da esposa, do pai e
do filho do protagonista sejam justamente
aqueles que desempenham tais papéis na vida real do diretor. Nesse sentido, é
como se o filme sugerisse que as fronteiras entre a arte e a vida fossem muito
tênues para Garrel. Diante dessa lógica, não é uma obra que se desenvolva através
de grandes reviravoltas – dilemas e conflitos se firmam com a fluência típica
da vida, os personagens têm comportamentos que variam entre o impulsivo e o
resignado. O estilo de filmar de Garrel é aquele característico de boa parte do
melhor de sua filmografia – as elipses que reduzem a narrativa ao essencial, o
formalismo de teor contemplativo, a trama que se configura como um pedaço
inconclusivo da vida de suas criaturas. Garrel não oferece ao espectador soluções
fáceis para aquilo que questiona ao longo da produção. E é justamente esse não
compromisso em amarrar todas as pontas que torna “Beijos de emergência” uma
obra tão inquietante e de encanto perene.
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