A premissa temática do documentário cambojano “A terra das
almas errantes” (1999) é bastante interessante: uma grande corporação de
comunicação pretende instalar fios óticos para instalação de internet por uma
vasta extensão territorial do Camboja e para isso contrata vários nativos para
escavar e enterrar o material em questão. Ao registrar esse processo, o diretor
Rithy Panh concebe um assustador e contundente retrato da miséria e atraso que
assolam aquele país há anos. O cineasta não recorre à narração over e nem a uma
ostensiva trilha musical – seu estilo de filmar e editar é seco, colhendo
documentários dos trabalhadores e imagens deles trabalhando e em atos
cotidianos. A partir do evento chave da atividade exploratória de uma mão-de-obra
rústica, o filme desenvolve uma aguçada perspectiva política e social do país,
em que as chagas de uma nação marcada por guerras e ditaduras são expostas com
crueza e raiva. Nesse sentido, Panh não se furta em chocar o espectador, com
imagens de mutilados de guerra laborando de forma intensa, pessoas com mãos e pés
lacerados e inchados pelo trabalho sem condições de segurança, indivíduos
desesperados com a remuneração irrisória que recebem pelos seus esforços. De
certa forma, há um ácido tom irônico na narrativa de “A terra das almas
errantes”, contrastando a intenção de modernizar o país pela implantação da internet
com o ato arcaico de explorar paupérrimos trabalhadores através de uma jornada
desumana e mal remunerada de trabalho incessante.
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