Em “O ancôra – A lenda de Ron Burgundy” (2004), o diretor
Adam McKay e o ator Will Ferrell conceberam uma obra que era reflexo direto de
suas experiências estéticas e temáticas no humorístico televisivo “Saturday
Night Live”. O fio de história era mero pretexto para uma sucessão desvairada
de cenas marcadas por uma comicidade alucinada, repletas de improvisos e nonsense.
O filme ainda servia como retrato corrosivo tanto do imaginário nostálgico dos
anos 70 quanto da imbecilidade do norte-americano médio no seu misto de
machismo e patriotismo. A produção se tornou referência para a comédia dos EUA
na década passada bem como delineou o tipo de humor que seria adotado por McKay
e Ferrell em suas colaborações conjuntas posteriores. Dessa forma, até é de se
estranhar que tenha demorado tanto para aparecer uma continuação. “Tudo por um
furo” (2013) retoma as aventuras de Burgundy (Ferrell), só que situando a história
nos anos 80 e em Nova Iorque. No cômputo geral, essa continuação não tem o
mesmo impacto criativo da primeira parte. Isso ocorre porque a formatação ficou
bem mais convencional, com a narrativa se prendendo a um roteiro mais
estruturado, com direito, inclusive, a discussões éticas e com final bem
moralizante, abusando ainda da revisão de certos clichês que haviam sido
trabalhados com mais convicção e inspiração em trabalhos anteriores da dupla.
Ainda sim, o filme tem os seus momentos hilariantes, em que o senso cômico de
Ferrell e companhia conseguem uma estranha síntese entre o cretino e o surreal,
mandando também às favas as noções de politicamente correto, além de captar com
razoável sensibilidade muito daquela atmosfera de individualismo exacerbado típica
dos anos 80.
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