Mesmo obedecendo a uma ordem narrativa típica do cinema
francês “de qualidade”, “Antes do inverno” (2013) consegue se sobressair por
algumas interessantes nuances. A trama em um primeiro momento foca suas atenções
no drama corriqueiro de um casal de meia-idade em crise sentimental. Aos
poucos, o roteiro evolui para algo mais profundo e inquietante, ao mostrar o
protagonista Paul (Daniel Auteuil), um bem sucedido neurocirurgião, tornar-se
obcecado por uma misteriosa e instável jovem (Leila Bekthi) que se prostitui nas
horas vagas. Mais do que uma simples aventura sentimental, a obsessão do
personagem corresponde também a uma viagem por um mundo desconhecido que se
contrapõe ao conforto asséptico de sua vida pequeno-burguesa. A atmosfera do
filme é de uma tensão difusa, em que as intenções e desejos dos indivíduos
nunca ficam claros. A descida de Paul a um submundo que não compreende e o
confunde faz lembrar as aventuras eróticas e existenciais daquele protagonista
de “De olhos bem fechados” (1999). O diretor Philippe Claudel pode não ter o
mesmo preciosismo formal de Kubrick, mas consegue algumas soluções estéticas e
temáticas eficientes em “Antes do inverno”, principalmente no expressivo
contraponto que faz entre um estilo “clean” de filmar e editar com o teor
obscuro de sua trama. A perturbadora conclusão do filme é uma contundente síntese
dessa abordagem artística de Claudel.
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