terça-feira, abril 30, 2013

Era uma vez eu, Verônica - de Marcelo Gomes ***1/2


O fato de “Era uma vez eu, Verônica” (2012) começar e terminar com uma grande suruba na praia não configura apenas um gosto pela sacanagem. No caso do filme, representa também uma declaração existencial de princípios e que também se revela em sintonia com a própria trajetória da protagonista Verônica (Hermilla Guedes) no filme. A personagem apenas quer extrair algum prazer da vida, independentemente das convenções sociais e pequeno-burguesas. Numa sociedade que defende valores arraigados em fortes tradições morais e religiosas, ainda que em pleno século XXI, o desejo de liberdade de Verônica acaba lhe deixando em crise pessoal. Em tempos de neo-conservadorismo e da assepsia temática e formal da produções oriundas da Globos Filmes, os dilemas e desejos da protagonista soam profundamente ousados e inquietantes. A questão da vontade por uma vida mais livre de convenções de Verônica parece influenciar o próprio tratamento estético concebido pelo diretor Marcelo Gomes para a sua obra. Se por vezes ele utiliza um registro objetivo, de tons que beiram o documental, em outros momentos sua câmera é livre, além dele valorizar uma considerável gama de efeitos visuais em termos de iluminação e enquadramentos, com o seu áudio enfatizando nuances como sussurros, gemidos, leves cantarolares. O fato da trilha sonora ser dominada pelas belas canções da Karine Buhr (uma lasciva combinação de rock, brega e regionalismos) sublinha com classe as intenções de Gomes. O resultado final desse conjunto formal é uma obra de efeito sensorial desconcertante, próximo do espírito libertário da protagonista.

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