quarta-feira, agosto 06, 2014

A farra do circo, de Roberto Berliner e Pedro Bronz **1/2


Boa parte dos registros visuais de arquivo que compõem a narrativa do documentário “A farra do circo” (2013) é composta por filmagens provenientes de fitas de VHS, em tomadas que oscilam entre trechos de reportagens e material cuja captação beira o amador. Por outro lado, os diretores Roberto Berliner e Pedro Bronz dispensam a presença de um narrador que com sua voz dê alguma ordem cronológica e didática para o filme. Assim, as imagens são jogadas na tela, bastando a “explicação” dos depoimentos de época, ou com o próprio audiovisual em si bastando para contextualizar o que se está assistindo. No final das contas, as escolhas formais da produção acabam lhe dando um certo caráter caótico e mambembe. Essa aparente esculhambação estética, entretanto, acaba ganhando um sentido existencial para a história que se quer contar no filme: a trajetória do Circo Voador, lendário espaço cultural da cidade do Rio de Janeiro. Surgido no início dos anos 80, o Circo foi palco para o surgimento de diversas manifestações artísticas que ansiavam por espaço para se expandirem diante do marasmo repressivo provocado pela ditadura militar (ainda que na época ela estivesse nos seus momentos finais), indo das perfomances anárquicas e irreverentes do grupo teatral Astrubal Trouxe o Trombone, passando pelos passos iniciais do rock brasileiro oitentista (Barão Vermelho, Blitz, Paralamas do Sucesso) e chegando até em happenings de poesia e dança com alguns dos mais expressivos poetas “malditos” da época. O filme por vezes fica um tanto cansativo pela falta de uma ordem formal mais depurada, mas também tem o seu encanto ao mostrar um período fascinante na história cultural do Brasil em que ingenuidade, amadorismo e sensibilidade conviviam aos trancos e barrancos diante de uma indústria de entretenimento ainda insipiente e bem menos tomada por interesses corporativos, além de mostrar que figuras hoje bem adaptadas ao mainstream já tiveram os seus dias de militância intensa e selvagem na vanguarda e no underground.

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