A discussão sobre os limites entre meios de expressão como cinema, literatura e teatro é recorrente, em que se buscam conceitos que estabeleçam distinções sobre a “pureza” de tais linguagens. Assim, é comum se ler/ouvir expressões que até se tornaram lugares comum como “teatro filmado”, “cinema literário” e afins. Para Julio Bressane, entretanto, tais convenções parecem pueris. Seus filmes cada mais refletem um universo particular que faz sentido quase que exclusivamente dentro de sua filmografia. Na realidade, o leque é ainda mais amplo, pois inclui outras vertentes como cinema, dança e pintura. Nesse sentido, Educação sentimental (2013) é uma obra que se delineia a partir de ideias, sensações e obsessões que afloram dos devaneios do cineasta. Mas não se trata de mero cinema aleatório – essa gama de elementos variados passa pelo filtro de um rigoroso senso estético de Bressane, dando à narrativa uma coesão notável e desconcertante. E para que esse sofisticado formalismo se manifeste, fundamental é o trabalho criativo da direção de fotografia de Walter Carvalho, que envereda por aqueles enquadramentos e iluminação que evocam um estilo pictórico que beira o renascentista na sua disposição cênica e nos jogos de claro e escuro, recursos imagéticos esses que já tinham sido trabalhados com brilhantismo semelhantes em outras obras fotografadas por Carvalho como A febre do rato (2011) e A erva do rato (2008), esta última também dirigida por Bressane.
E por falar em A erva
do rato, Educação sentimental é
continuação natural daquele trabalho, não só pela cinematografia de Carvalho,
mas também por nuances formais como os sinuosos diálogos literários, o roteiro
carregado de simbolismos intrincados e a encenação anti-naturalista (essa
última reforçada pela extraordinária atuação no estilo possessão de Josie
Antello). Há, inclusive, também como em A
erva do rato, as cenas nos créditos finais trazendo um “making-of” que
apresenta o próprio processo de desenvolvimento criativo como matéria dramática
para o filme. Em se tratando de Bressane, entretanto, não dá para falar em mera
reciclagem – o que se vê na tela é o cineasta burilando atos e noções pouco
usuais no cinema contemporâneo, mas que reforçam o papel do diretor como nome
singular e fundamental no panorama do cinema brasileiro.
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