Seria muito fácil simplesmente catalogar “The punk singer” (2013)
como uma obra panfletária e cuja apreciação teria um caráter restrito para
interessados nos movimentos feminista e punk. Ao ter esses nichos dentro de sua
temática, entretanto, o documentário dirigido por Sini Anderson mostra que o
seu alcance é bem mais amplo. Para retratar a trajetória pessoal da cantora e
compositora Kathleen Hanna, líder de extraordinárias bandas como Bikini Kill e Le
Tigre, o filme usa uma estética original e contundente, em que parece ganhar
uma formatação no estilo de um fanzine audiovisual. Assim, sua concepção de
narrativa imagética tem um caráter sujo, por vezes até frenético, embalando um
conteúdo que ora pode soar apaixonado, ora transpira revolta. Ou seja,
perfeitamente de acordo com a arte incômoda e raivosa de sua protagonista. É
curioso que com o desenvolver da narrativa essa linha atribulada tanto da
narrativa como da própria vida de Hanna vai assumindo uma ambientação mais
serena e melancólica, configurando “The punk singer” como uma espécie de crônica
sócio-cultural de uma época dita civilizada e dominada por avanços tecnológicos,
mas que na verdade também é marcada pela intolerância e cinismo morais. O filme
consegue desenvolver com notáveis lucidez e sensibilidade boa parte das camadas
existenciais de uma mulher como Hanna: a artista criativa e contestadora, a
feminista que desafia tabus e ortodoxias, a pessoa fragilizada pelo ódio de
detratores e pela doença. O resultado dessa penetrante visão artística é uma obra
que tanto pode encantar pela beleza fulgurante da arte de sua biografada como
pelo humanismo cortante que brota do sentido simbólico de seus conflitos e
dilemas.
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